Tag: Estatística Mercadológica

Planejando Ações Comerciais com Apoio de Métodos Estatísticos

O ano era 2010. Estava trabalhando como Consultor de Planejamento de Vendas numa grande empresa, líder no mercado nacional em sua área de atuação. Minha missão: entender os motivos que a levaram a deixar de ser líder em três Unidades Federativas específicas, ficando inclusive em terceiro lugar em uma delas. Mais do que entender os motivos, eu deveria criar um modelo estatístico que ajudasse a prever quando a empresa recuperaria o primeiro lugar nesses Estados, a partir da combinação de diferentes ações promocionais que, combinadas conjunta ou sequencialmente, garantissem tal recuperação, sem chances de combate por parte da concorrência. Meu foco estaria voltado aos números e às informações de todas as ações publicitárias e promocionais dos últimos cinco anos, tanto da nossa empresa, quanto das empresas concorrentes, e, para tanto, eu teria à disposição todos os gerentes comerciais de todas as Unidades Federativas envolvidas no estudo, para entrevista-los e para contar com eles no levantamento dessas informações. Desde que as informações fossem confiáveis e bem detalhadas, não haveria muita dificuldade em realizar este trabalho. Porém, alguns desafios foram surgindo:

  1. Alguns atuais gestores comerciais eram profissionais de pouco tempo de empresa e não possuíam muito domínio sobre as ações realizadas nos últimos cinco anos;
  2. Assim como ocorre com a maioria das empresas, nossa empresa havia se preocupado em documentar muito mais suas próprias ações publicitárias e comerciais, do que as ações da concorrência, o que viria a dificultar um pouco minhas análises de correlação entre elas;
  3. Outro problema clássico: muitas empresas lançam duas ou mais promoções ao mesmo tempo, no intuito de acelerar seus resultados. O problema é que quando essas promoções focam mesmos produtos e/ou nichos de mercado, e ainda, possuem pouca diferenciação de abordagem publicitária, fica difícil interpretar o percentual de influência de cada uma delas sobre o resultado atingido. É o que também aconteceu em nossa empresa em situações específicas nos últimos cinco anos.
  4. Um problema técnico e cultural específico: muitos gestores olhavam para mim e questionavam: “como que este consultor conseguirá nos dizer o que fazer, estudando apenas números e informações coletadas em arquivos word, planilhas Excel e mídias impressas diversas?”.
  5. E o grande problema em torno disso tudo: o Presidente da empresa, embora um cara muito tranquilo e de elevado carisma, havia colocado a cabeça desses gestores comerciais à prêmio, caso não conseguissem recuperar sua liderança. Por conta disso, alguns desses gestores passavam o dia inteiro me rodeando, perguntando e às vezes me pressionando, a fim de obterem de mim uma fala a mais segura e confiante possível. Às vezes, cansado, eu brincava um pouco com eles, passando informações parciais desencontradas, só para se ocuparem sozinhos com seus conflitos psicológicos.

Mas vamos lá: o trabalho começou em Janeiro e foi concluído em meados de Fevereiro. Foi preciso muita manipulação de dados, cálculos de correlação, elaboração de algoritmos (equações) que pudessem representar da melhora maneira possível (maior índice de confiança possível) a relação entre variáveis como:

  • Preço;
  • Disponibilidade dos produtos e serviços;
  • Combinação de pacotes de produtos e serviços ofertados;
  • Evoluções tecnológicas que viriam a influenciar a qualidade e percepção de valor sobre os produtos e serviços;
  • Descontos e bônus promocionais;
  • Esforços publicitários;
  • Períodos do ano;
  • Facilidades de pagamento.

No que tange à técnicas específicas da estatística mercadológica, foi preciso calcular fatores relacionados ao comportamento do consumidor, tais como:

  • Tendência;
  • Sazonalidade;
  • Comportamentos cíclicos.

Por fim, ainda fora preciso realizar tudo isso conciliado entre duas, três e quatro empresas do mercado, através da análise de correlação e de regressão linear… E tudo que eu não conseguia explicar eu revertia para a margem de erro deste estudo, chamando-a de Fator Irregular.

Quando o trabalho terminou, veio a apresentação da solução a todos os envolvidos. As melhores alternativas de ação para os próximos um ano e oito meses… Isso mesmo: para os próximos um ano e oito meses. Alguns gerentes quase entraram em pânico ao terem contato com essa previsão. Mas eu não podia melhorá-la, pois estava atrelada aos números. A minha parte estava feita, naquele momento. Eu poderia continuar por lá, a fim de garantir sinergia das ações em relação ao planejamento, mas concordamos que um comitê garantiria esse acompanhamento. Sendo assim, segui meu caminho para realizar outros trabalhos de consultoria, deixando-os com a missão. Um ano e oito meses depois, mais precisamente em Outubro de 2011, entrei em contato com a Diretoria Comercial da empresa para saber dos resultados. Eu havia errado a previsão: maldito Fator Irregular…rsrsrs…Eles haviam retomado a liderança em Setembro, não em Outubro.

Esse artigo resume o quanto é importante gerenciarmos bem os dados e as informações em nossas empresas. Não apenas no que se refere à nossa empresa, mas no que se refere a todo o mercado e muito mais do que isso: principais informações sobre nossa política, economia, questões sociais, etc., podem fazer diferença para nossas estratégias futuras. Não há como saber diferenciar todas as informações entre o que é um “Sinal” a ser aproveitado, ou um “Ruído” a ser descartado. Por isso, no caso da gestão de informações, temos que ser um pouco obsessivos por detalhes.

Neste exato momento que escrevo este artigo, uma greve nacional dos caminhoneiros se espalha por todo o país, de maneira muito organizada, gerando grande impacto na economia, em curtíssimo intervalo de tempo. Há mais ou menos dez anos atrás o movimento grevista dos caminhoneiros, muito desorganizado, vinha fracassando nas negociações com o governo; porém, naquela época, acabou aproximando-se de um movimento altamente organizado e de elevado senso tático e estratégico: o MST – Movimento Sem-Terra. Eram os oportunistas – MST – se aproveitando de um descuido do Governo, para orientar um movimento, digamos assim, de estilo amador. Pois bem: na estatística existem vários teoremas que tratam de tendências e fatores cíclicos e que ajudam a prever fatos que se repetem ou se transformam de tempos-em-tempos. A greve dos caminhoneiros é um desses fatos.