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Entendendo e Planejando sobre a Rotatividade e o Absenteísmo Profissional

Há alguns anos atrás, durante uma rodada de discussão junto a profissionais de RH, fui questionado sobre os assuntos rotatividade e absenteísmo… e tudo começou com a seguinte pergunta: “Daniel, como eu faço para estabelecer o melhor índice de rotatividade para a minha empresa?”. Naquele momento, desenvolvi uma resposta um pouco mais direta, mas aqui, neste artigo, é importante que antes eu estabeleça alguns conceitos importantes, já que nem todos estão ambientados com os assuntos em pauta.

Primeiramente, do que se trata o índice de rotatividade: Mede a movimentação (admissões e desligamentos) dos empregados de uma organização em um determinado período de tempo. Serve para avaliar a renovação da equipe. A rotatividade ótima deve situar-se dentro de uma faixa, pois valores elevados apontam problemas no clima organizacional ou na política salarial, enquanto valores muito baixos indicam pouca oxigenação da equipe.

E do que se trata o índice de absenteísmo: É a fração do tempo não trabalhado em decorrência das ausências, em relação ao total do tempo contratado. Valores menores indicam resultados melhores. Os tipos de absenteísmo podem ser: voluntário, involuntário, por patologia profissional, por doença e aquelas amparadas por lei (legal).

A respeito do absenteísmo, nosso posicionamento tem que ser bem simples e direto: desejamos 0% em termos de ausências. Mas vale um único cuidado ao calcular este índice: as ausências a serem contabilizadas devem ser aquelas sobre horas que estavam estabelecidas para efetiva produção do funcionário. Ou seja: horários que já são destinados a algum tipo de paralisação de produtividade não podem entrar no cálculo.

Agora, ao falarmos em rotatividade, a discussão é um pouco mais complexa. Inclusive, já presenciei colegas de mesma profissão – consultores – afirmarem que as empresas precisam perseguir a rotatividade zero. Claro que não. Basta um simples exemplo, para mostrarmos o contrário: há empresas que possuem processos operacionais bem específicos, com um teor muito repetitivo, baixa complexidade – leia-se, no caso, com pouco ou nenhum desafio – e sem expectativa de evolução para a carreira do funcionário, e, neste sentido, é até saudável que a rotatividade seja elevada. Em outras profissões, a complexidade até pode ser elevada, porém o desgaste físico à médio e longo prazo é tão grande, que não compensa manter o profissional naquela mesma posição; se não há maneiras de aplicar o que chamamos de “job rotation”, ou seja, rotatividade interna de posições de trabalho sem o desligamento do funcionário, a opção que nos sobra é o desligamento, para gerarmos a oxigenação necessária para se manter a qualidade do serviço.

Para responder sobre qual o melhor índice percentual de rotatividade de uma empresa, precisamos entender que não há um indicador global que reflita a realidade da empresa por inteiro. Empresas geralmente possuem departamentos com processos e pessoas de características distintas, e ainda, com perfis distintos lideranças que possam agravar ainda mais tal cenário. Neste sentido, é importantíssimo entendermos a realidade de cada departamento, para então estabelecer o índice de cada um deles. É mais ou menos assim:

Primeiramente, devemos estudar os processos do departamento e reconhecer suas complexidades e o seu valor para o negócio. Adicionalmente, devemos estabelecer um elo entre esses processos e as competências profissionais que são exigidas para que tais processos possam ser executados com efetividade. Neste ponto, é importante que entremos na seara que, modéstia a parte, dominamos muito bem, qual seja, a análise estatística dos processos. E o que seria esta análise? Seria levantar o consumo de recursos por esses processos – no caso, estamos falando de recursos como tempo, pessoas, relatórios, matérias-primas, produtos físicos acabados, etc. – e fazer uma projeção dos recursos ideais envolvidos durante um determinado período. Paralelamente, retornarmos às competências profissionais envolvidas nesses processos, para avaliarmos o nível de dependência da qualidade de execução de cada um deles, em relação às habilidades e os conhecimentos que estão implícitos (tácitos) nas pessoas e não no processo em si. Neste ponto, estamos falando da nossa “zona de risco das competências essenciais e diferenciais”. Como não quero estender demais este artigo, posso resumir esta questão da seguinte maneira: devemos minimizar ao máximo o cenário em que a qualidade do serviço ou do produto resultante de um processo seja fruto apenas das competências individuais, buscando, na verdade, o enriquecimento dos processos. Neste caso, muitas empresas inteligentes valorizam os profissionais competentes que transferem para o processo a inteligência que possuem, permitindo que o processo se torne mais rápido e seguro e que possa ser executado por profissionais de menor qualificação. E, por se tratar de empresas inteligentes, elas não descartam estes profissionais mais qualificados após este investimento nos processos; ao contrário, continuam a contar com eles para o que chamamos de “melhoria contínua dos processos e da qualidade”. Mas não irei entrar demais nestas questões que tratam mais da nossa disciplina de Business Process Management – BPM. Para sintetizar este parágrafo, podemos dizer: precisamos entender qual o equilíbrio de competências entre os nossos processos e os nossos profissionais. Ao enxergarmos isto, saberemos em qual ponto podemos conviver com uma rotatividade maior e em qual ponto precisamos nos preocupar mais. Mas não é só isso. Continuando:

Através da estatística, conseguimos fazer uma projeção quanto aos degraus e os limites de evolução na carreira, não apenas visualizando processos de um único departamento, mas visualizando as interfaces existentes entre processos de departamentos distintos e a capacidade da empresa em promover o job rotation e as linhas de progressão de cargos e funções em meio à estrutura organizacional. Podemos pontuar todas as competências que serão exigidas nesta projeção, para cada caminho possível de progressão profissional, e formular uma hipótese do percentual de profissionais que atingem cada nível de carreira na empresa. Em cada nível, teremos profissionais que ficarão estagnados e profissionais que continuarão em uma das linhas de progressão. Inclusive, esta hipótese, anualmente, poderá ser atualizada de acordo com a evolução obtida nos últimos doze meses, para que a estatística vá se corrigindo gradativamente. E, paralelamente a esta parte do trabalho, é necessário conciliarmos o número de profissionais necessários, as horas de produção real, as horas de ociosidade que precisam existir de forma saudável em cada processo.

E há algo muito legal que conseguimos elaborar neste momento (às vezes por suposição, às vezes através de estatística que aproxime bem a realidade): o gráfico de ciclo de vida da qualidade de um processo, quando executado por um mesmo profissional durante um período de tempo.

Finalizando então esta atenção dada ao índice de rotatividade a partir da gestão de processos, precisamos equilibrar tudo isso com os custos relacionados à reposição das posições de trabalho. Por exemplo: podemos chegar a conclusão que é saudável, a cada ano, renovarmos 20% do quadro de pessoal de um departamento específico; porém, os custos envolvidos no desligamento e nova contratação podem acabar exigindo um ajuste deste percentual para, por exemplo, 15%. Pode não parecer tão relevante esta preocupação, mas pensemos, por exemplo, no ramo da metalurgia: em estudo recentemente realizado no Estado do Paraná, algumas indústrias metalúrgicas apresentaram um custo médio de reposição profissional de quase oito vezes o salário nominal do posto de trabalho alvo da reposição.

Mas, e então, para sairmos desta explicação talvez muito massiva para aqueles que não dominam a gestão de processos e a estatística, como responder a pergunta feita de forma simples e direta no início deste artigo? Respondendo, então:

  1. O índice ideal de rotatividade da minha empresa é representado pelo conjunto de índices de rotatividade ideal de cada um dos seus departamentos.
  2. Em cada departamento, é preciso contar com um número seleto de profissionais de elevada qualificação, não para executar os processos, mas para promover sua melhoria contínua. Neste número seleto, é prudente estimar o limite de tempo para que um deles solicite desligamento ou troca de função, e, neste sentido, enxergar no grupo de profissionais menos qualificados aquele que possui condições e interesse de evoluir (sua aproximação ao grupo seleto precisa ser imediata). Eventualmente, será preciso trazer de fora (do mercado) profissional deste gabarito.
  3. Para o grupo menos seleto, os processos precisam estar adaptados para serem executados num ritmo confortável, sem necessidade de intervenção de competências tácitas provenientes desses funcionários. O percentual de rotatividade neste grupo terá relação com aqueles profissionais que possuem condições de serem promovidos ao longo do tempo, como também terá relação com aqueles que eventualmente perderão o interesse ou não atingirão o desempenho esperado e que não conseguirão ser recuperados pelas ações internas de desenvolvimento promovidas pela empresa.
  4. E, então, como sabermos se estamos dentro da faixa percentual correta de rotatividade profissional: se a qualidade do seu negócio continua dentro dos níveis exigidos, se o seu negócio continua a prosperar, se o esforço de recrutamento e seleção não está aumentando, se o clima organizacional proveniente dos relacionamentos continua saudável, etc., estes serão sinais de que sua empresa encontra-se dentro da faixa de rotatividade correta.

Muito importante: o índice ideal de rotatividade profissional de uma empresa pode se alterar ao longo do tempo.

Por fim, gostaria de compartilhar meu ponto de vista sobre as ações que julgo serem as principais para garantirem a fidelização dos funcionários à empresa. Na verdade, existem ao menos cinquenta ações possíveis e que as empresas inteligentes tem explorado, mas irei escolher dez ações com as quais eu melhor me identifico:

  1. Fazer um recrutamento e seleção com máxima aderência ao que a empresa necessita e ao que ela pode oferecer ao funcionário: nem sempre precisamos do melhor profissional do mercado, mas daquele que irá se adaptar perfeitamente aos nossos processos e que tenha necessidades e interesses para os quais a empresa realmente possa contribuir.
  2. Ter ótimos líderes e uma comunicação aberta e interativa em cada um dos principais processos da empresa;
  3. Ser capaz de aplicar doses de desafio aos seus funcionários: o ser humano necessita, no mínimo, de pequenos desafios para se motivar;
  4. Preocupar-se em projetar o futuro do negócio e das carreiras profissionais envolvidas, compartilhando esta visão aos funcionários;
  5. Ser uma empresa que invista em novos conhecimentos, gerando em cada um dos seus funcionários a sensação de que “trabalhando conosco, você estará aumentando seu potencial de empregabilidade”;
  6. Ser uma empresa em dia com as suas obrigações junto aos seus funcionários e, se possível, ser capaz de oferecer benefícios diferenciados, de acordo com a necessidade de cada um. Neste ponto, é importantíssimo que a empresa seja madura o suficiente para distinguir “interesses” e “necessidades” dos seus funcionários;
  7. Ser uma empresa que garanta a integridade física dos seus funcionários;
  8. Ser uma empresa que se orgulhe do que faz e que saiba vender internamente – via endomarketing – sua imagem aos funcionários;
  9. Ser uma empresa que promova projetos, criando pequenas situações de mudança, no contexto de “ar de renovação”;
  10. E, por fim, que seja uma empresa justa: que avalie desempenhos, que valorize quem mereça ser valorizado, que crie planos de desenvolvimento factíveis e que saiba cobrar, quando for preciso e com legitimidade.